epidemia
como a cidade colabora
Já faz parte do calendário de Fortaleza. No primeiro semestre, ocorre o aumento no número de pessoas acometidas pelas doenças transmitidas pelo Aedes Aegypti. Já não dá nem para chamá-lo de mosquito da dengue devido aos inúmeros casos de Chikungunya e Zika vírus nos últimos três anos. As campanhas orientando os cidadãos de como combater os focos do mosquito tornam-se constantes. Diante a essa situação, fica o questionamento. Por que a cidade de Fortaleza ainda é vítima das doenças do Aedes Aegypti?
De acordo com o biólogo e doutor em saúde coletiva, Carlos Alencar, a capital cearense tem características naturais e estruturais que propiciam a proliferação do mosquito. Clima quente e úmido são as condições ideias para a sobrevivência do vetor. Só para se ter ideia, o Aedes Aegypti tem uma média de vida de 40 dias aqui na cidade enquanto no sul essa expectativa cai para 20.
“Temos uma condição climática muito boa porque temos uma temperatura elevada e umidade alta por conta da brisa do mar. Então, ele consegue ter uma velocidade de reprodução mais rápida e tempo maior de sobrevida”, explica.
O clima não é o único fator que favorece o surgimento dessas epidemias. A falta de um saneamento básico compatível com o tamanho da cidade aliado a determinados hábitos da população facilitam a proliferação. Segundo o último levantamento Rápido do Índice de Infestação por Aedes Aegypti (LIRAa), disponibilizado pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS), 41% dos focos dos focos de mosquito são encontrados em depósito ao nível do solo, como tanque, tambor, poços, cisternas.
Esses resultados são reflexos de problemas nas assistências à população. O uso de tanques, tambor, cisternas para o armazenamento de água representa a necessidade dos fortalezenses de armazenar água, apontando deficiências no acesso ao serviço. “Existem bairros de Fortaleza que não têm abastecimento de água todos os dias. Se há falta de água na casa, como vou pedir ao cidadão para jogar a água fora?”, questionou o doutor.
Já o Técnico de Vigilância Municipal de Saúde, Eduardo Amêndola, aponta as deficiências na distribuição, mas diz que o principal problema não é o armazenamento e, sim, como se armazena.
“Armazenar água não é proibido. É uma necessidade em virtude de um abastecimento irregular. Não há problema desde que seja armazenada de forma correta para que não haja esse tipo de proliferação”, disse em entrevista ao especial Epidemia. Ao perguntar sobre o abastecimento de água em Fortaleza, a Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) informou que 98% da cidade tem acesso ao abastecimento de água
O infectologista e mestre em Doenças Tropicais, Rômulo Sabóia, apontou outra problemática: a presença de casas abandonadas e terrenos baldios em Fortaleza. Segundo ele, esses locais oferecem condições ideais para a proliferação do mosquito já que não há uma vistoria regular por parte da Prefeitura nem dos proprietários.
“Borracharias, casas de praia, oficinas mecânicas, casas fechadas têm uma legislação que as obrigam a estarem adequadamente livre dos focos e o setor público não faz o seu papel de fiscalização”, critica. De acordo com o segundo levantamento do LIRAa, 16 terrenos baldios apresentaram focos do mosquito em Fortaleza.
O especial Epidemia procurou a Agência de Fiscalização de Fortaleza (Agefis) para saber como funciona a fiscalização desses espaços e quantas multas já foram aplicadas neste ano, mas até o momento não obteve resposta.
Essas condições contribuem para a reprodução do mosquito e, consequentemente, no aumento de pessoas atingidas pelas doenças. De acordo com o Sistema de Monitoramento Diário de Agravos, a taxa de incidência da zika, dengue e chikungunya na capital é respectivamente de 1.054 casos/ 100 mil hab, 35.966 casos/100 mil hab e 140.764 casos/ 100 mil hab.
Além disso, alguns bairros de Fortaleza apresentaram uma taxa de infestação predial, que refere-se ao número de focos nos mosquitos em imóveis, acima do permitido pela Organização Mundial de Saúde que é de 1%. O levantamento, realizado no período de 13/06 a 23/06, é expresso pelo número de imóveis com a presença de larvas ou pupas do Aedes Ageypti em relação ao total dos residência visitada.
Mais de 40 mil imóveis da capital foram vistoriados e, desse montante, 559 apresentam focos do mosquito e das seis regionais, apenas a regional IV obteve um índice de infestação predial de padrão satisfatório, estabelecido pela OMS. Os demais estão acima de 1% e sendo classificados em estado de alerta.