epidemia
Apesar de desde a metade do século passado casos de Zika e Chikungunya já virem sendo registrados, no Brasil, os registros dessas doenças ainda são muito recentes. A sensação é de lidar com um inimigo tenebroso e desconhecido, mas que nos conhece muito bem e sabe nossos pontos fracos.
Segundo Roberto da Justa, esses vírus são antigos, mas estavam contidos em um ciclo silvestre em que os primatas eram os maiores acometidos. “Na hora em que o homem invade a floresta, ele acaba se tornando também uma vítima, e como o homem é dinâmico, ele acaba levando para outras regiões”.
Mas por que essas doenças demoraram tanto a chegar por aqui? E se já havia casos em outros Países, com estrutura e clima semelhantes, era esperado que chegassem uma hora ou outra?
“Como eram doenças de transmissão pelo mesmo vetor da Dengue, muito presente no mundo tropical, então a gente imaginava que elas pudessem chegar ao continente americano, isso era questão de tempo”, explica Roberto. E o tempo propício se fez com o grande fluxo de pessoas presente no País durante a Copa do Mundo FIFA 2014.
Nesse meio tempo, com a chegada desse ‘novo inimigo’, instalou-se uma corrida contra o tempo para saber que consequências essas doenças podem deixar a longo prazo e ainda como ajudar àqueles que sofrem com elas no presente.
“Há muita lacuna do conhecimento, não só em termos de transmissão, prevenção, de manifestações clínicas, mas ainda há muito o que se avançar em termos de tratamentos, vacinas. A ciência tem uma tarefa árdua para trazer respostas para muitas perguntas, a gente tem aprendido muito com essas doenças”, comenta Roberto.
A zika foi um exemplo de doença que surpreendeu. Aparentemente, no adulto ela não deixa nenhuma sequela grave e é uma doença viral de baixíssima mortalidade. Mas quando acomete gestantes, “as consequências no feto são catastróficas, e isso é um conhecimento de três anos para cá”, completa o infectologista.
Além disso, outras consequências podem existir e que ainda não foram percebidas. No caso do vírus Zika, até que ponto ela pode trazer problemas até mesmo a uma criança que não nasceu com microcefalia? “Ela pode ter alguma alteração comportamental e isso são consequências dessas viroses que a gente só pode perceber daqui a 10, 20 anos”.
No Brasil todo, pesquisadores de várias áreas buscam soluções. No Ceará, a anestesiologista e acupunturista Fabiana Freire desenvolve uma pesquisa para a sua especialização em dor em que estudar as dores crônicas em pacientes acometidos pela Chikungunya.
“Como a Chikungunya é uma doença incapacitante e persiste com dores por muito tempo, em alguns casos até um ano depois, tenho pegado muitos pacientes no meu consultório de acupuntura”, explica.
Para os estudos, ela faz uso de uma tecnologia chamada Termografia de Infravermelho para mapear as dores de origem nervosa, dores neuropáticas e investigar que tipo os pacientes têm. “E partir daí talvez poder tratar adequadamente, evitando a cronificação da dor”.
A médica Catarina Almeida, especialista em cirurgia vascular e coordenadora Residência Médica de Cirurgia Vascular do Hospital das Clínicas de Pernambuco, vem desenvolvendo desde o começo de 2016 uma pesquisa que relaciona a chikungunya a complicações de origem linfática.
Após o surto da doença em Pernambuco, ela e sua equipe começaram a observar muitos pacientes que estavam na fase aguda da Chikungunya, ou saindo dessa fase aguda, com edema de membros inferiores de características linfáticas. “A gente pegou pacientes que tinham chikungunya, com diagnóstico sorológico, e, em outros casos, diagnóstico clínico”.
Foram feitos exames de linfocintilografia para avaliar se os edemas eram de origem linfática. Com relação à doença e a cirurgia vascular, já existiam descritos na literatura acometimentos vasculares pela chikungunya.
“No caso da nossa pesquisa, alguns pacientes permaneceram com o linfedema irreversível, até hoje são pacientes que precisam fazer o uso de meia elástica, drenagem, e outros regrediram. O problema de continuar o linfedema é que ele é uma doença de caráter irreversível, e uma vez que ele se instala, pode ser progressivo, pode levar a outros problemas por disfunção linfática”.
As pesquisas não se restringem a nível profissional. Em Iracema, município 285km distante de Fortaleza, os estudantes Gabriel Moura e Myllena Cristyna, orientados pela professora Thyana Vicente e pelo universitário Helyson Lucas, atuam em uma pesquisa para desenvolver uma molécula capaz de inibir a proteína que é responsável pelo processo de replicação do Vírus do Zika no organismo.
"Usando química computacional, modelagem molecular e matemática aplicada nós conseguimos desenvolver uma molécula de forma in silica (Feito em computadores). Após realizarmos toda parte in silico, conseguimos um apoio e desenvolvemos de forma in vitro (Feito em Lab), e fizemos uma comparação com dos dois métodos", explica Myllena.
A parte in vitro mostrou 98% de semelhança com a parte in silico, comprovando que a molécula poderia inibir a proteína e impedir que o vírus se multiplicasse.
"Nós fizemos 4 simulações de como seria aplicada. Com vacina, ingerir como líquido ou comprimido, aplicado diretamente no sangue ou aplicar próximo a barriga para pessoas que já passaram por cirurgia". De todos esses 4 métodos, três deram certo. "Apenas o que é aplicado diretamente no sangue apresentou uma porcentagem de "erro"", comenta a estudante.
Para que os resultados da pesquisa cheguem até a população, é preciso ainda fazer testes em humanos, mas Myllena relata que ainda falta apoio para que a pesquisa prossiga.
Em nossa região não tem Laboratório equipado que nos dê suporte. [O poder público] gasta muito dinheiro com medicamentos que nem são eficientes enquanto existe de jovens com soluções baratas e rápidas para problemas enormes", conclui.
Imagem de microscópio eletrônico do vírus da zika (pontos pretos) em tecido humano Foto: Foto: Cynthia Goldsmith/ CDC
Exame Termografia de Infravermelho mapeia as origem das dores. Foto: Fabiana Freire / Divulgação
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